sábado, 10 de agosto de 2013

Sentindo a "Sabedoria" na ponta dos dedos

Ao erguer o corpo que mais pesado fica pela armadura que visto, apoiando maior parte do peso no braço esquerdo, aquele que em cada batalha e descoberta sustém graciosamente o meu escudo, é o que mais se esforça dos dois. Num movimento ágil, tendo agora os dois pés assentes no solo cinzento, dirijo-me á fiel espada que se enterrou no manto polido cinza. Quando agarro no cabo para tomar posse dela novamente, sinto-a mais pesada, como se tivesse sido reforjada sem eu saber. Ao puxá-la do chão, sinto um esforço implacável no ombro, as veias do braço preenchem-se, os músculos do braço contraiem-se e ela não se movimenta nem um pouco. Como é possível? Aquela espada havia sido forjada só para para a minha mão, o peso ideal para fluir naturalmente a cada golpe, feita de aço com gravações no cabo e no vinco. O seu nome. "Sabedoria", batizada por apenas ser utilizada com sabedoria, manchá-la de sangue sem justa causa, não seria digna de ter tal nome. Desde que me tornei cavaleiro esta companheira sempre esteve do meu lado e salvou-me em momentos bastante difíceis, criei um elo com ela bastante especial, apesar de ser um mero objecto, uma arma, a minha ligação interna com ela é superior a alguma ligação com outro ser. Digo isto como certo porque ela jamais me falhará, se eu lhe exigir um golpe rápido na perna do meu oponente, ela responderá sem hesitação. Quando toco no cabo sinto como que uma corrente que me prende a ela, que fortalece a minha ligação. Talvez sejam hábitos de quando aprendi a manejá-la. Apenas sei afirmar que ela faz tão parte de mim como eu dela.

Não faz sentido que eu não a consiga erguer, não compreendo o que está errado, será que a minha honra por ter perdido os sentidos foi levada e com ela o direito de empunhar a "Sabedoria"? Também não entendo porque ela está desembainhada e porque está enterrada no solo... Alguém terá aproveitado enquanto estava inconsciente e me profanou a companheira, como que se de uma mulher esturpada se tratasse... Quem se terá aproveitado da minha inconsciência? Quem seria cobarde ao ponto de fazer algo desta natureza?
Puxo a espada, ela não se move, agarro o cabo com as duas mãos e puxo novamente exercendo força nas costas e nos braços. A " Sabedoria" permanece inalterada, como se nem tentasse movê-la, nem um chirrido do aço. Nada. Sento-me em frente a ela, incrédulo por não compreender o que se passa, sinto uma impotência e uma enorme vaga de inutilidade, na minha cabeça não faz sentido, a minha força deveria ser suficiente para retirá-la da fenda.

Retiro o elmo, retiro as luvas metálicas, esfrego as mãos uma na outra por aliviar os músculos e passo as mãos no cabelo. Sentado com as mãos na cabeça, sentindo o peso da incapacidade cada vez mais real, não sairei daqui sem "Sabedoria"... Sabedoria? É isso! Não é uma questão de força, mas de sabedoria! Ela não se move por mais força que eu faça por isso deve estar posicionada de alguma forma que anule toda a força que faço!

Levanto-me novamente e começo a inspecioná-la de perto, observo a fenda, tento puxá-la calmamente em várias direcções, tentando compreeder se existe alguma diferença. Ao puxar na orientação da fenda, ela move-se minimamente. Percebi. Ela está presa de forma que se puxar na vertical com demasiada força, permaneça inalterada, isto porque pelo que parece ela está nesta posição há demasiado tempo, o que poderá fazer com que o a sua dimensão dentro da fenda possa ter alargado minimamente, o que já é suficiente para uma imobilização como estas. Abano-a mais umas vezes e ela acaba por sair completamente, ergo a "Sabedoria" com ambas as mãos em direcção ao Céu, a luz reflecte no seu gume. Um raio luminoso é projectado pela estrada cinzenta fora. Uma sensação de euforia invade-me o corpo, por saber que não me trato de nenhum inútil nem de um incapaz, apenas deixei a minha mente cair nas trevas da realidade física e não fui além. Se o me eu mestre tivesse assistido a este problema, teria no mínimo intitulado-me de "Cabeça de Sopro", como intitulou várias vezes.

Já não parto deste lugar sem a minha "Sabedoria", de agora em diante estará sempre ao alcance das pontas dos meus dedos. Rumo agora a respostas sobre onde estou e o que aconteceu á flora antes existente.

3 comentários:

  1. gostei muito da história, continua com o bom trabalho :), ansiosa pelo proximo capitulo.

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  2. É impossível que não nos sintamos envolvidos pelos cenários que consegues desenhar e pelas sensações que as tuas palavras causam. Sinto-me rendido, cativado e apaixonado por esse cavaleiro. Deixas-me orgulhoso por escreveres coisas assim. Parabéns, como sempre, pelo belíssimo trabalho - ao qual chamo arte - que crias dentro de ti.

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  3. Olá. O "Relojoeiro" recomendou-me o teu blog e li este texto e adorei, bastante explicativo, consegues desenvolver as emoções e os sentimentos.
    Gostei bastante e já estou a seguir :D
    bjs

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